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Premissas Educacionais

Atualmente, os programas educacionais devem fundamentar-se em um conjunto de premissas consistentes, com os conhecimentos gerados pela investigação científica, no campo da educação, e, potencialmente, efetivas para a formação de profissionais com os atributos desejados. Estas premissas são apresentadas a seguir.

Centrado no estudante

O estudante desempenha um papel central no processo de ensino-aprendizagem ao longo de um programa educacional. Isso pressupõe que:

  • O estudante deve exercer papel ativo na construção do seu próprio aprendizado, por meio da mobilização de conhecimentos e experiências de que já dispõe, estabelecendo seus objetivos de aprendizagem e buscando, de maneira ativa, novas informações;
  • Uma fração importante das atividades educacionais deve ser dedicada ao estudo individual, de modo que estimule o estudante a assumir a responsabilidade por seu aprendizado e a conduzi-lo com autonomia crescente;
  • O estudante deve envolver-se no processo de avaliação, de modo que desenvolva a capacidade de formular um juízo crítico de sua performance e de seus colegas.

Baseado em Problemas

O problema é, preferencialmente, o ponto de partida e o eixo condutor do processo de aprendizagem no programa educacional. A aprendizagem, a partir de problemas, favorece a estruturação de redes de conhecimentos, organizadas da maneira mais adequada à sua utilização posterior. A abordagem de problemas, em pequenos grupos, promove, além da aprendizagem de conhecimentos integrados, o desenvolvimento de atitudes de cooperação, o suporte mútuo e a congruência social. Um processo de aprendizagem, baseado em problemas, apresenta as seguintes características:

  • O problema é o ponto de partida de todo o processo de aprendizagem. Para o trabalho com o problema, os estudantes são organizados em pequenos grupos e têm o suporte de um facilitador;
  • A partir do problema, todos os conhecimentos do grupo são mobilizados para a geração de hipóteses explicativas, que conduzem à identificação de objetivos de aprendizagem;
  • Após uma busca ativa de novas informações, pelos estudantes, utilizando-se de múltiplos recursos de aprendizagem para responder aos objetivos traçados, as hipóteses formuladas, anteriormente, são “testadas” e enriquecidas ou modificadas de acordo com os conhecimentos adquiridos.

Aprendizagem no contexto

Segundo achados em investigações científicas, os conhecimentos, adquiridos em contextos semelhantes àqueles em que deverão ser utilizados, permanecem mais acessíveis na memória, facilitando sua recuperação e aplicação.

Por isso, os currículos dos programas educacionais, que são elaborados nessa perspectiva, procuram assegurar a máxima similaridade entre o contexto, onde a aprendizagem acontece, e aquele onde os profissionais (estudantes) deverão atuar. A aprendizagem no contexto se expressa nos seguintes aspectos:

  • A aprendizagem dar-se-á, preferencialmente, em torno de problemas ou temas, gerados no âmbito de encontros estudante-usuário/paciente e/ou interações entre estudantes entre si e estudante/comunidade;
  • Os estudantes têm oportunidade para vivenciarem diferentes situações, que correspondem, progressivamente, àqueles reais, de acordo com o contexto do seu ambiente de trabalho.

Abordagem por Competências, Multidisciplinar e Integrada

Uma abordagem multidisciplinar e integrada é favorecedora de uma compreensão profunda dos fenômenos, relacionados à saúde, por parte do estudante-trabalhador.

Outra dimensão da integração, que é valorizada nos currículos, refere-se aos aspectos, relacionados às competências, que devem ser desenvolvidas pelos profissionais de saúde ao longo de seus processos de formação e educação permanente.

A Abordagem por Competências vem marcando, fortemente, os processos de reforma educacional em diferentes países, desde a década de 1960. No Brasil, ela pauta a educação de modo mais intenso, a partir dos anos de 1990. Seu conceito vem recebendo diferentes significados, às vezes, contraditórios e, nem sempre, suficientemente claros para orientar a prática pedagógica das escolas. Para o Conselho Nacional de Educação do Brasil (CNEB), entende-se por competência profissional a capacidade de articular, mobilizar e colocar em ação valores, conhecimentos e habilidades necessários ao desempenho
eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho.

Compreendendo a importância de bem conceber esta abordagem, no campo da educação, para orientar os programas de formação, a Escola de Saúde Pública do Ceará, tomando esta abordagem como referência para o desenho de seus currículos, aponta o socioconstrutivismo como referencial epistemológico, que orienta a concepção de competência, compreendendo que o sujeito constrói conhecimentos, partindo do que ele já conhece sobre o assunto, sendo fundamental a sua participação ativa para o desenvolvimento das competências profissionais em seu itinerário formativo.

Compreende-se, assim, que competência vai para além do fazer, exclusivamente técnico, e o seu desempenho eficiente e eficaz está para além da atividade e responsabilidade exclusiva do sujeito da ação. Envolve, também, uma ação coletiva e o contexto de trabalho.

Para Le Boterf (2005), “ser competente é ser capaz de agir e de sair-se bem com competência dentro de uma situação de trabalho (atividade a realizar, evento que se mostra a frente, problema a resolver, projeto a realizar). Ser competente é colocar-se em atividade em uma prática profissional pertinente, mobilizando uma combinação apropriada de recursos (saber, saber-fazer, comportamento, modo de raciocínio) (…), para o desempenho eficiente e eficaz de atividades, requeridas pela natureza do trabalho”. O autor, também, reconhece a competência como atributo coletivo, sem contudo deixar de fazer uma reflexão sobre a dimensão pessoal.

A ESP/CE entende essa dimensão com um sentido desafiador, à medida que a formação, baseada em competências, deve articular conhecimentos amplos e específicos de maneira a promover uma maior capacidade de análise de situações complexas para apoiar a tomada de decisão do(s) sujeito(s) envolvido(s) na ação.

É sob essa perspectiva que a capacidade técnica não pode ser, unicamente, considerada quando falamos de competência, pois não se faz suficiente ante os desafios, situados em sistemas complexos de atuação profissional, como é o caso da saúde. Le Boterf (2005) defende:

Ser competente significa saber agir e reagir, diz-se: “saber o que fazer” e “quando”. Frente aos imprevistos e frente a complexidade dos sistemas e das lógicas de ação, o profissional deverá saber tomar as iniciativas e as decisões, negociar e arbitrar, fazer as escolhas, tomar os riscos, reagir, inovar no cotidiano e tomar as responsabilidades. Para ser reconhecido como competente, não basta mais ser capaz de executar o prescrito, mas de ir além do prescrito (LE BOTERF, 2005, p.59).

Desse modo, o desenvolvimento de atitudes e habilidades, tanto no campo cognitivo – incluindo o raciocínio científico – como nos âmbitos afetivo ou perceptual-motor, será valorizado e conduzido de forma integrada à aquisição de conhecimentos no processo de aprendizagem. A ênfase na formação de atitudes, usualmente escassas nos programas tradicionais para o ensino, na área da saúde, busca, inclusive, responder às demandas crescentes por um profissional dotado de uma visão integral dos principais problemas de saúde.

Essa concepção de competência traz grandes desafios para as instituições formadoras, à medida que exige novos desenhos curriculares, com metodologias e estratégias pedagógicas, que permitam a coerência entre o proposto e o praticado, nas diversas etapas do desenvolvimento curricular, envolvendo os diferentes sujeitos dos processos formativos.

A abordagem por competência, multidisciplinar e integrada se expressará nos seguintes aspectos:

  • O desenho dos currículos dos diversos programas educacionais deve ser baseado no desenvolvimento de competências, conforme concepção acima apresentada;
  • A organização curricular deve assumir a configuração de módulos, que devem ser multidisciplinares, ou seja, incluir conceitos de diferentes áreas e disciplinas, relacionadas à saúde pública;
  • O desenvolvimento de habilidades e atitudes, requeridas para a abordagem do(s) problema(s) em estudo, dar-se-á, simultaneamente, e de forma integrada à aquisição de conhecimentos a eles relacionados;
  • As diversas dimensões, que compõem as competências, esperadas do estudante trabalhador – dimensões técnicas, científicas, pessoais e profissionais, relacionadas ao sistema de saúde e à sociedade – serão abordadas no âmbito dos módulos, de forma integrada, em torno do problema ou do tema em estudo.

Orientação e base na comunidade

Os programas educacionais, orientados e baseados na comunidade, são direcionados para formar profissionais aptos a lidarem com os problemas de saúde, mais relevantes no contexto onde eles atuarão, assegurando a coerência entre o perfil estudante-trabalhador e as necessidades da população e configurações do sistema de saúde.

Os programas educacionais, que têm orientação e base na comunidade, apresentam as seguintes características:

  • Os conteúdos curriculares refletem as necessidades da comunidade e abordam os problemas de maior prevalência e relevância no contexto sociossanitário da população;
  • A aprendizagem dá-se, majoritariamente, em estreita relação com a comunidade ou em ambientes e estruturas a ela pertencentes;
  • A experiência do trabalho de saúde na comunidade é utilizada como um fator de estímulo para que os profissionais possam avaliar e analisar as forças políticas, sociais, culturais e econômicas, que influenciam a saúde e a doença, e como um instrumento para o desenvolvimento de suas capacidades para atuarem em equipe com outros profissionais.