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Metodologias Ativas de Ensino-Aprendizagem

As metodologias ativas de ensino-aprendizagem são caracterizadas pelo ensino centrado no estudante, pelo desenvolvimento da autonomia do mesmo na construção de seu conhecimento e pela integração entre teoria/prática e ensino/serviço. Esses tipos de metodologias vêm tendo destaque na formação em saúde nas últimas décadas. Elas representam a ruptura do modelo tradicional de ensino e passam a estruturar a educação de forma integrada, reflexiva e crítica, de maneira a desenvolver, nos estudantes, a capacidade de encontrarem soluções para um problema em consonância com o perfil psicossocial da comunidade na qual ele está inserido (CYRINO e TORALLES-PEREIRA, 2004; MARIN et al, 2010; MITRE et al, 2008).

Nas metodologias ativas de ensino-aprendizagem, o estudante deixa de receber, passivamente, os conteúdos, assumindo a responsabilidade pela sua aprendizagem. Por meio de processos interativos de conhecimento, análise, estudos, pesquisas e discussões em grupo, o estudante é instigado a estabelecer relações entre suas experiências prévias e os novos conceitos em estudo, a fim de construírem novos significados, novas interpretações e relações. É um método que estimula a autoaprendizagem e facilita a educação permanente, porque desperta a curiosidade do estudante e valoriza aquilo
que tem importância, que tem significado para sua vida (profissional, intelectual, social).

O professor, nesse novo contexto, atua como facilitador ou orientador do processo de ensino, guiando o estudante para que faça pesquisas, reflita e decida, por ele mesmo, o que fazer para atingir o objetivo de aprendizagem (MARIN et al, 2010; MITRE et al, 2008). Os métodos de aprendizagem ativa trabalham, intencionalmente, com problemas para o desenvolvimento dos processos de ensino-aprendizagem e valorizam o aprender a aprender (BERBEL, 1998). A reflexão, sobre as situações-problema, desencadeia a busca de fatores explicativos e a proposição de solução ou soluções para os problemas. Desta forma, problematizar significa ser capaz de responder ao conflito intrínseco que o problema traz (ZANOTTO, DE ROSE, 2003). Os conhecimentos são construídos pelo estudante, que precisa ser reorganizado à sua estrutura cognitiva prévia para descobrirem relações ou conceitos que ele precisará assimilar e reestruturar (GARCIA MADRUGA, 1996).

Dentre as metodologias ativas, que embasam a formação e o desenvolvimento profissional em saúde, três são apontadas como principais: Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) ou Problem Based Learning (PBL), como é mais conhecido, Metodologia da Problematização e Aprendizagem Baseada em Equipes – Team Based Learning (TBL).

Problem Based Learning (PBL)/Aprendizagem Baseada em Problemas

Problem-Based Learning (PBL)/Aprendizagem Baseada em Problemas, nascida na Universidade McMaster, no Canadá, e, hoje, amplamente, adotada em diversos países, é considerada como uma das mais importantes inovações no campo da educação dos profissionais de saúde nas últimas décadas e guarda estreita coerência com os princípios da aprendizagem, consolidados pela investigação no campo da psicologia cognitiva. O PBL permite, por suas características essenciais, superar muitas das limitações centrais da educação convencional e vem, consequentemente, sendo adotado como eixo central
em diversas escolas, que atuam na formação e educação permanente de profissionais de saúde, e em muitas instituições em diversos países, incluindo o Brasil.

De maneira sintética, no PBL, o processo de aprendizagem é estruturado por meio dos trabalhos de grupos tutoriais (GT), formados por oito a dez estudantes, atuando com o suporte de um facilitador, integrante do corpo docente. Nos grupos tutoriais, os conhecimentos são compartilhados e sistematizados em torno de problemas previamente elaborados. Os grupos tutoriais são, dessa maneira, o eixo do processo de aprendizagem em torno do qual se articulam as demais atividades educacionais complementares, como os treinamentos de habilidades e atitudes, as práticas na comunidade, os projetos individuais e em equipes, as práticas de laboratório, mini-exposições interativas e outras.

Os grupos tutoriais seguem uma abordagem sistemática, intitulada “Sete Passos do PBL” (Figura 1), que se inicia pela definição e análise de um problema, para a qual os estudantes buscam, neste primeiro momento, utilizar-se de conhecimentos de que eles já dispõem. Uma avaliação de lacunas e conhecimentos a serem adquiridos para a resolução do problema gera objetivos de aprendizagem, que, no momento subsequente, orientam a busca de fontes de informações e o estudo individual. Reunidos, novamente, em seu grupo tutorial, os participantes compartilham os resultados de seu estudo individual, aplicando-os à resolução do problema e verificando, com a ajuda do tutor, se os tópicos foram abordados e o problema resolvido, incluindo as propostas de transformação da realidade, quando pertinente.

Metodologia da Problematização

A Metodologia da Problematização baseia-se no aumento da capacidade do estudante em participar como agente de transformação social, durante o processo de detecção de problemas reais e de busca por soluções originais. Procura mobilizar o potencial social, político e ético do estudante, para que este atue como cidadão e profissional em formação. No Brasil, essa Metodologia fundamenta-se nos princípios de Paulo Freire, tendo como referência os trabalhos de Diaz Pereira, pautados no arco de Maguerez, que propõe um esquema de problematização da realidade em cinco etapas: observação da
realidade; identificação dos pontos-chave; teorização; hipóteses de solução e aplicação à realidade (MARIN et al, 2010).

A primeira etapa é a “observação da realidade”, quando é identificado o problema. É o início de um processo de apropriação de informações pelos participantes, que são levados a observarem a realidade em si, com o seu olhar, e a identificarem-lhe as características para, mediante os estudos, encontrarem soluções, que contribuam para a transformação da realidade encontrada. Os estudantes, apoiados pelo facilitador, selecionam uma das
situações e a problematizam.

Definido o problema a estudar/investigar, inicia-se a segunda etapa, que consiste em uma reflexão acerca dos possíveis fatores e determinantes maiores, relacionados ao problema, possibilitando uma maior compreensão da complexidade e da multideterminação do mesmo. Os estudantes, também, deverão observar a existência das variáveis menos diretas, que interferem na existência do problema em questão. Tal reflexão culminará na “definição dos pontos-chave do estudo”, cuja investigação possibilitará uma nova reflexão sobre o mesmo. Os pontos-chave podem ser expressos de forma variada: questões básicas, que se apresentam para o estudo; afirmações sobre os aspectos do problema; tópicos a serem investigados; ou, ainda, por outras formas. Assim, possibilita-se a criatividade e flexibilidade nessa elaboração, após a compreensão do problema pelo grupo. É necessário que os estudantes percebam que os problemas de ordem social são complexos e, geralmente, multideterminados. O estudo deve ser crítico e reflexivo, tendo em vista que os estudantes estão, a todo o momento, em busca da solução do problema. A partir dessa análise, os estudantes devem elaborar a síntese dos pontos essenciais, que deverão ser estudados, no intuito de compreender o problema de maneira profunda e encontrar formas de interferir na realidade para solucioná-lo.

A terceira etapa, a da “teorização”, é o momento de construir respostas mais elaboradas para o problema. Os dados obtidos, registrados e tratados, são analisados e discutidos, buscando-se um sentido para eles, tendo sempre em vista o problema. Todo estudo, até a etapa da teorização, deve servir de base para a transformação da realidade. Então se chega à quarta etapa, a das “hipóteses de solução”, em que a criatividade e a originalidade devem ser bastante estimuladas para se pensar nas alternativas de solução. Bordenave (1989) afirma que o estudante usa a realidade para aprender com ela, ao
mesmo tempo em que se prepara para transformá-la.

A quinta etapa, a da “aplicação à realidade”, é aquela que possibilita o intervir, o exercitar, o manejar situações associadas à solução do problema. A aplicação permite fixar as soluções geradas e contempla o comprometimento do pesquisador para voltar para a mesma realidade, transformando-a em algum grau (COLOMBO; BERBEL, 2007).

A Metodologia da Problematização resulta, portanto, em uma aprendizagem significativa, pois considera a interação entre os conhecimentos prévios e o
aprofundamento dos temas em estudo, para a descrição do processo de aprendizagem, visto que isso possibilita o estabelecimento de associações entre os elementos novos e aqueles já presentes na estrutura cognitiva. A aprendizagem significativa estrutura-se em um movimento de continuidade – o estudante é capaz de relacionar o conteúdo apreendido aos conhecimentos prévios – e de ruptura – surgimento de novos desafios, os quais deverão ser trabalhados pela análise crítica, levando o aprendiz a ultrapassar suas vivências (CYRINO; TORALLES-PEREIRA, 2004; MITRE et al, 2008).

Aprendizagem Baseada em Equipes (TBL)

Uma alternativa de Metodologia Ativa de Aprendizagem, na educação de trabalhadores da saúde, é a Aprendizagem Baseada em Equipe – Team Based Learning (TBL). O TBL é uma estratégia educacional bem definida, que está sendo utilizada cada vez mais na educação. Foi desenvolvida, originalmente, para as escolas de negócios e outras de ensino superior.

Há vários estudos na literatura que mostram evidência empírica dos potenciais benefícios do TBL no processo de ensino-aprendizagem, levando a um maior envolvimento dos estudantes, uma maior qualidade nos processos de comunicação e as melhores notas nas avaliações, nos exames de certificação de categorias profissionais, como no National Board of Medical Examiners (NBME).

O TBL é composto por três fases que se repetem. Durante a primeira fase, os estudantes leem e estudam, independentemente, o material para estudo antes da aula. Durante a segunda fase, os estudantes realizam um teste para avaliar sua compreensão básica de fatos e conceitos, incluídos na fase 1 do estudo, do material.

Após o teste individual, equipes pré-designadas de 5-7 estudantes voltam a fazer o mesmo teste, formando um consenso sobre cada resposta. Essas respostas consensuais são avaliadas para imediato feedback.

Quando o professor sente que os estudantes já têm o domínio dos conceitos fundamentais, adquiridos nas fases 1 e 2, o grupo, então, deve realizar atividades de aplicação na fase 3. Durante a fase 3, os estudantes trabalham em suas equipes, em atribuições que oferecem a oportunidade de aplicarem os conhecimentos adquiridos nas fases 1 e 2, em problemas do mundo real.

Simulação Realística

A simulação realística é um método avançado para treinamento e, na área da saúde, vem sendo utilizada no treino de habilidades, principalmente em atividades de risco. Dessa forma, a simulação realística objetiva aumentar a segurança do processo de aprendizagem no treinamento de atividades práticas. Na área da saúde, sua aplicação é ainda recente, mas vem apoiada por alta tecnologia e é reproduzida por meio de cenários clínicos com equipamentos específicos que possibilitem desenvolver experiências da vida real. São utilizados: simuladores, manequins e atores, em instalações apropriadas que criam um ambiente simulado de atendimento nas diversas áreas da saúde e em diferentes situações de saúde em geral com o objetivo de estimular e garantir a segurança no processo de capacitação na assistência ao paciente.

É uma formação contemporânea com abrangência multiprofissional que trará para a Escola de Saúde Pública ESP/CE, a partir de 2020, uma valorização para os métodos de aprendizagem na busca de aperfeiçoar as atividades educacionais. O currículo que agrega à sua estrutura de aprendizagem cenários especializados, preocupa-se com uma proposta destinada ao desenvolvimento de competências exigidas para o exercício das profissões da saúde, conforme previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN).

A Simulação Realística é um método educacional que pode ser utilizado em todas as etapas de um curso da saúde e pode ser distribuída de acordo com planejamento das unidades curriculares propostas. Apresenta de forma gradual ao discente diferentes cenários, que podem ser simples ou complexos e contemplam desde o treinamento de procedimento de menor complexidade ou habilidade específica, chegando a simulações de alta fidelidade (High-Fidelity Simulation).

É desenvolvida em espaço criado especificamente para este fim: o Centro de Simulação Realística (CSR). O CSR da Escola de Saúde Pública Paulo Marcelo Martins Rodrigues – ESP/CE fornece ferramentas para a criação de cenários apropriados para a formação segura e interativa de futuros profissionais da saúde, simulando situações com diversos graus de complexidade e esferas que envolvem o cuidado em saúde.

Nesta proposta metodológica, são estimuladas também as tomadas de decisão e as relações interpessoais, completando um conjunto de atividades que proporcionam experiências voltadas ao desenvolvimento de capacidades técnicas psicomotoras, cognitivas e afetivas.

Educação a Distância

O sistema de ensino brasileiro para os trabalhadores da saúde ainda não está devidamente preparado para assumir, em curto prazo, o processo de capacitação de toda a demanda dos recursos humanos necessários. A carência de profissionais capacitados tem sido um dos fatores mais limitantes do desenvolvimento de serviços e programas para a população. Novas estratégias educacionais têm sido propostas, destacando-se a Educação a Distância (EaD).

De fato, a EaD tem sido uma das alternativas educacionais propostas para capacitar profissionais de uma maneira mais rápida, com qualidade e sem a necessidade de deslocamento constante por parte dos participantes. Isso é de fundamental importância no contexto do SUS, já que a maioria dos profissionais, a serem qualificados, já está inserida nos serviços de saúde e boa parte deles reside em diferentes locais, muitas vezes, distantes das instituições de ensino de saúde e dos diversos recursos tradicionais de ensino e aprendizagem (Universidades, bibliotecas de saúde, sociedades médicas,
entre outros). Na realidade, a EaD, aliada às metodologias ativas de aprendizagem, pelas suas características, parece bastante adequada para a formação e educação permanente dos trabalhadores da saúde.

Desenho de Currículo Baseado em Competências

O desenho do currículo é um processo fundamental para o sucesso de um curso em qualquer abordagem educacional. Nas Metodologias Ativas de Aprendizagem, esse processo é imprescindível.

Na realidade, o termo currículo é compreendido de diferentes formas. Alguns acham que se trata, apenas, do conjunto dos conteúdos a serem cobertos por um determinado curso (conhecido como grade curricular). Outros pensam que, além do conteúdo, o currículo deve conter, também, os métodos e as técnicas de ensino. Outros são da opinião que, o currículo confunde-se com o próprio curso, devendo abranger desde sua justificativa, os objetivos de aprendizagem, sua estrutura, os conteúdos, os métodos, as técnicas de ensino e o processo de avaliação do facilitador, do estudante e do próprio curso (POSNER, 1987).

Há currículos que tendem a ser mais inovadores e os que são mais tradicionais, centrados no professor, com ênfase nos conhecimentos e estruturados em disciplinas. Contemporaneamente, tem sido, cada vez mais, proposta a utilização de currículos inovadores, que têm algumas características específicas, como centrados no estudante, que enfatizam o desenvolvimento de competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) e são baseados em problemas ou casos.

Em uma perspectiva mais abrangente, currículo pode ser conceituado como um plano para um determinado curso, que inclui a justificativa, as competências, os objetivos de aprendizagem, o perfil da clientela (conhecimentos, habilidades e atitudes prévios), os princípios e as premissas educacionais, a estrutura (módulos, unidades, seções, etc.), os conteúdos, os métodos e as técnicas de ensino, o sistema de monitoramento e a
avaliação do facilitador, do estudante e do curso, como também o sistema de organização e gerenciamento do curso.

Existem, na literatura, diversos modelos para o desenho de um currículo, como os clássicos Tyler Rationale, publicado em 1949, e o Modelo de Johnson, de 1967, aprimorado em 1977 (POSNER, 1995). Mais recentemente, foram propostos outros modelos, como o Modelo de Harden (HARDEN, 1986), o Modelo de Posner & Rudnitsky (POSNER; RUDNITSKY, 1989), e a abordagem de Ten Cate (1997).

A abordagem de Ten Cate é uma proposta pragmática, que estabelece dez passos para desenhar um currículo. O Quadro 1 resume seu ponto de vista. Propõe-se, ainda, incluir a elaboração de um Mapa Conceitual, que apresenta o conjunto de tópicos e subtópicos a serem abordados no currículo, com suas interconexões.

Essa sistemática pode ser usada para o desenho de qualquer currículo, principalmente, para o planejamento de cursos, que utilizam Metodologias Ativas de Aprendizagem. É bom ressaltar ainda, que a descrição dos passos, de maneira sequenciada, pode criar a falsa impressão que se trata de uma abordagem linear. Na realidade, muitos dos passos são inter-relacionados e muitos esboços são necessários antes da versão final do currículo. De fato, o desenho de um currículo é um processo, essencialmente iterativo, de frequentes idas e voltas.

Pode-se utilizar a Matriz de Competência, como uma ferramenta de planejamento curricular, na qual, para cada competência, são elaborados objetivos de aprendizagem, cognitivos, de habilidades e atitudinais, relacionando-os com um conjunto de estratégias educacionais e a carga horária estimada.

Várias vantagens da utilização dessa sistemática são descritas na literatura. Currículos elaborados dessa maneira respondem melhor às necessidades levantadas (problemas identificados), ficam mais adequados ao contexto e à clientela; têm propósitos e objetivos de aprendizagem mais claros; têm uma maior coerência interna; ficam mais fácil de serem implementados e gerenciados; possuem um sistema de avaliação do estudante e do curso, coerente com os propósitos e objetivos de aprendizagem; e são mais efetivos e eficazes. Além disso, os docentes compreendem melhor a lógica do currículo, ficam mais motivados, e têm melhor desempenho e os estudantes ficam mais motivados e aprendem mais.

Estratégias educacionais complementares

Além das estratégias educacionais, classicamente, utilizadas nas abordagens ativas de aprendizagem, como os Grupos Tutoriais (GT), no PBL, e o Arco de Maguerez, na Metodologia da Problematização, um conjunto de outras estratégias educacionais complementares pode ser utilizado para promover o desenvolvimento das competências, propostas no currículo, e o alcance dos objetivos de aprendizagem nas três dimensões: cognitivas, de habilidades e atitudinais. Exemplos de métodos complementares são Treinamentos de Habilidades (TH), Estudos de Caso (EC), Estudos Dirigidos (ED), Práticas na Comunidade (PC), Projetos em Equipe (PE), Ensino-Aprendizagem AutoDirigido (EAAD) e Ensino-aprendizagem em Ambientes de Trabalho (EAAT). Podem, ainda, ser utilizadas ferramentas de Educação a Distância (EaD), como fóruns virtuais e chats, disponibilizados em Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA).